O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou seguimento (julgou inviável) à Reclamação (RCL) 32052, por meio da qual a Abril Comunicações S/A pedia a suspensão de decisão que proibiu a realização de entrevista, pela Revista Veja, com Adélio Bispo dos Santos, apontado como autor do atentando ao presidente eleito Jair Bolsonaro. Em 6 de setembro deste ano, em compromisso de campanha, o então candidato ao cargo de presidente do país sofreu atentado à faca supostamente desferido por Adélio, preso em flagrante no mesmo dia e autuado no artigo 20 da Lei de Segurança Nacional.
Na ação, a editora questiona decisão de desembargador do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) que, ao deferir liminar em mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público Federal, determinou a suspensão de entrevista jornalística que seria efetuada com o custodiado em 28 de setembro de 2018, no Presídio Federal de Campo Grande (MS).
Segundo a Abril, a decisão ofende a autoridade do Supremo, consubstanciada no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, quando o Plenário declarou a não recepção da Lei de Imprensa (Lei 5.250/1967) pela Constituição de 1988. Sustenta que, ao impedir produção de material jornalístico pela Revista Veja, a decisão teria ocorrido em censura prévia, em ofensa, portanto, os artigos 5º, IX e XIV, e 220 da Constituição Federal.
O SBT apresentou pedido de extensão de liminar, pois alega que também teria sido prejudicado pela decisão do TRF-3.
Decisão
Para o relator, não há semelhança entre o fundamento da decisão do TRF-3 e o assentado pelo Supremo no julgamento da ADPF 130. O desembargador do TRF-3, explicou o ministro, ao decidir o caso em questão, não o fundamentou em nenhum dispositivo da Lei de Imprensa. “Ademais, da leitura do julgado, vê-se que não houve restrição à liberdade de imprensa, nem qualquer espécie de censura prévia ou de proibição de circulação de informações”, disse.
O ministro destacou que a relação entre a liberdade de expressão e de comunicação e outros valores constitucionalmente protegidos pode gerar situações conflituosas, “a chamada colisão de direitos fundamentais”. No processo de concretização da liberdade de imprensa, esclareceu, o Judiciário tem o papel de interpretar a aplicação de princípios constitucionais eventualmente conflitantes.
No caso concreto, segundo o relator, o juízo reclamado, ao analisar a situação fática, destacou a importância da proteção das investigações e da prevenção de possíveis prejuízos processuais, bem como a necessidade de proteção do próprio custodiado, cuja sanidade mental ainda era discutível. Concluiu, diante de tais ponderações, que o momento não era adequado para a realização da entrevista pleiteada. “Vê-se, pois, que o ponto principal desta ação não recai sobre a liberdade de imprensa, em si. Discutiu-se, em verdade, se seria o momento adequado a permitir a exposição de preso provisório, mantido em presídio de segurança máxima, acusado de cometer crime contra a segurança nacional e cuja sanidade mental era contestável. Objetivou-se a proteção não apenas das investigações, ainda em curso, mas principalmente do próprio réu, custodiado do Estado”, afirmou o relator.
Observou ainda que a temática relacionada à liberdade de imprensa é bastante ampla e nem toda e qualquer intervenção judicial relacionada a esta matéria terá sua resposta no decidido por esta Corte na ADPF 130. Além disso, o relator acrescentou que o instrumento processual da reclamação não pode ser empregado como substitutivo de recurso ou atalho para se chegar ao Supremo, conforme o caso dos autos. “Transformar esta Corte em verdadeira segunda instância de qualquer decisão relacionada a conflitos entre liberdade de imprensa e outros valores constitucionais, por meio de reclamação, não é compatível com nossa arquitetura constitucional”.