João Pessoa é uma cidade encantadora e aprazível, especialmente para quem curte desfrutar da brisa e da beleza da sua orla, seja caminhando, correndo, pedalando, andando de skate, patins, patinetes ou mesmo passeando de automóvel ou de moto.
Como diz a canção de Cátia de França, “o amanhecer, a Ponta do Cabo Branco em ouro se torna” e, sobretudo no horário de 05:00 h às 08:00 h, vem atraindo muita gente à prática de esportes por toda a extensão da sua orla urbana, ou seja, ao longo das praias do Bessa, Manaíra, Tambaú, Cabo Branco e Seixas.
Como sabemos, na cidade, um dos grandes desafios é organizar o trânsito e minimizar os riscos de acidentes, ou melhor, ordenar e disciplinar o fluxo de veículos, de pessoas e de animais, para que possamos trafegar de forma segura e responsável pelas suas ruas e avenidas, com o fim primordial de preservar vidas.
Recentemente, a Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP) iniciou um trabalho de reordenamento da orla da Capital e também uma “campanha educativa” para orientar a população quanto ao compartilhamento desses espaços públicos, em particular as vias de circulação de veículos motorizados e não‐motorizados, definidas pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB) como sendo as superfícies para trânsito de veículos, pessoas ou animais, envolvendo a pista, a calçada, o acostamento, a ilha e o canteiro central.
Assim, objetivando prevenir acidentes e reduzir riscos, a Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana (Semob‐JP), conforme propagou no seu portal de notícias (“Semob‐JP realiza ação educativa sobre compartilhamento de espaço na orla”), além de abordar e orientar as pessoas, passou a distribuir ao longo da orla da cidade, antes das 05:00 h da manhã, cavaletes com orientações de regras de boa convivência no trânsito, para despertar em cada indivíduo o respeito pelo uso consciente e seguro das
vias.
Lamentavelmente, essa política de “conscientização” e de apelo ao senso do dever, realizada pela Semob‐JP, não vem surtindo o efeito desejado. Basta verificar o comportamento costumeiro de alguns pedestres e skatistas ao invadirem a ciclovia, bem como dos ciclistas ao transitarem pelas calçadas. Isso vem criando uma situação caótica na circulação dessas vias, sem que ninguém seja, pelo menos, advertido pelas autoridades de segurança, policiais militares, guardas municipais ou agentes de trânsito,
que eventualmente se façam presentes nesses espaços públicos.
Mas, perigo maior é o que vem ocorrendo na ladeira do Cabo Branco. Diferente do que acontece em boa parte da orla urbana da cidade, aquele trecho não conta com o bloqueio da via para veículos motorizados. A Semob‐JP tem se limitado a distribuir no centro da via alguns “cavaletes educativos”, os quais apresentam os seguintes dizeres:
(i) “Atenção ciclista! Não aglomere na concentração ou dispersão. Respeite o seu espaço!”;
(ii) “Atenção! Na ladeira do Cabo Branco, siga as regras gerais: Ciclo, use a ciclofaixa em
baixa velocidade. Pedestre, caminhe na via ao lado da ciclofaixa.”;
(iii) “Atenção ciclista!
Atenção à velocidade. Evite acidentes. Respeite o seu espaço!”;
(iv) “Atenção ciclista!
Pedale em fila indiana, contribua com a ordenação. Respeite o seu espaço!”;
(v) “Atenção
pedestre! Não caminhe em grupo. Evite aglomeração. Respeite o seu espaço!”.
Como se verifica, trata‐se de uma política pública educativa que visa alertar apenas os caminhantes e ciclistas sobre as suas condutas e seus lugares ao transitarem naquele espaço.
No entanto, da forma como está sendo desenvolvida, essa “política pública de cartaz” se mostra inócua, ineficaz e de baixa efetividade, pois tem pouco efeito na mudança de comportamento das pessoas e, por conseguinte, na diminuição da violência no trânsito e no número de vítimas, além de não contar com uma fiscalização contínua.
Os veículos automotores têm transitado sem nenhuma restrição em todos os horários dos dias da semana. Já os pedestres e ciclistas têm circulado, todos juntos e misturados, ora pela faixa dos carros, ora pela ciclovia, em perigo iminente de sofrerem algum acidente.
Vale registrar que, como revelam os dados do DATASUS, no Brasil, o trânsito mata tanto quanto a violência criminal. No ano de 2019, foram registrados em todo o País 32.879 (trinta e duas mil, oitocentos e setenta e nove) mortes por acidentes e 44.033 (quarenta e quatro mil e trinta e três) homicídios. Nesse mesmo ano, o trânsito em João Pessoa matou 185 (cento e oitenta e cinco) pessoas, o que corresponde a uma taxa de estimada de 22,9 para cada 100 mil habitantes, bastante superior às taxas do Brasil (15,6), da Região Nordeste (17,7) e da Paraíba (19,3). Com relação ao número de homicídios, na Capital paraibana ocorreram 217 (duzentos e dezessete) assassinatos, representando uma taxa de 26,8 em cada 100 mil habitantes, também superando as registradas no País (21,0) e em toda Paraíba (23,6).
Essas altíssimas taxas de mortalidade, seja no trânsito ou por ações criminosas, escandalosamente revelam o quanto a vida humana neste País é, vergonhosamente, depreciada e banalizada.
Outra questão que causa espécie e que revela uma situação de altíssimo risco nesse trecho da ladeira do Cabo Branco é a falta de infraestrutura para a circulação segura e tranquila dos pedestres. O trecho de “calçada” lá existente, localizada no lado direito de quem sobe, se mostra irregular e esburacado, criando uma situação de risco para quedas, que podem resultar na fratura de braço, perna ou mesmo da cabeça, cuja pancada pode ser fatal. Curiosamente, um dos “cavaletes educativos” ‘orienta’ que o pedestre “caminhe na via ao lado da ciclofaixa”. O problema é que a ciclovia tem de um lado a pista de rolamento e do outro a barreira, criando uma situação de extremo risco e perigo para os pedestres.
Nesse sentido, o recomendável é que, urgentemente, a PMJP determine a revisão dessa política tímida dos cartazes, adotando soluções técnicas mais eficazes, quais sejam: (i) bloquear o trânsito de veículos automotores pela ladeira do Cabo Branco, com o fim de prevenir acidentes e salvar vidas, como também minimizar os impactos na barreira; (ii) intensificar a fiscalização do trânsito, especialmente nos horários da prática de atividade física pelos pedestres e ciclistas, dando o devido cumprimento ao que
estabelece o CTB; (iii) instalar câmeras de vigilância, com o fim de dinamizar o monitoramento e tornar a fiscalização mais eficiente, eficaz e efetiva; e (iv) construir uma calçada para o trânsito seguro dos caminhantes.
Washington França da Silva
Coronel da reserva da Polícia Militar da Paraíba, Doutor em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública e Diretor‐presidente do Instituto Brasileiro de Segurança e Justiça ‐ iBRASJUS