O Senado aprovou nesta terça-feira (17) o projeto que cria um programa de pagamento de dívidas dos estados com a União (Propag), com previsão de juros menores e parcelamento do saldo em até 30 anos. O texto também cria um novo fundo para compensar os estados menos endividados. Todos os 72 senadores presentes votaram a favor. A proposta (PLP 121/24) vai à sanção.
As dívidas estaduais somam atualmente mais de R$ 765 bilhões — a maior parte, cerca de 90%, diz respeito a quatro estados: Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. A votação foi acompanhada pelos governadores Cláudio Castro (RJ) e Romeu Zema (MG).
Apresentado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o projeto já havia sido aprovado pelo Senado em agosto e foi aprovado pela Câmara dos Deputados na semana passada. Como sofreu mudanças, o PLP retornou para nova votação no Senado.
O relator, Davi Alcolumbre (União-AP), acatou parte do substitutivo da Câmara, mas rejeitou outros trechos. De acordo com Davi, algumas alterações e inclusões fugiram do que foi previamente acordado com os estados e o governo federal. Ele destacou que a iniciativa de Pacheco é fundamental para permitir que os estados superem as dívidas históricas.
— É uma alternativa para que estados subnacionais possam arcar com as suas despesas a partir do alongamento da dívida e a partir da decisão política coletiva entre a Câmara dos Deputados e o Senado da República, de mãos dadas com o governo federal, fazendo com que esses recursos, que outrora iam apenas para pagamento de juros da dívida, possam ter uma nova destinação — apontou Davi.
Mesmo senadores de estados que estão com as dívidas controladas manifestaram apoio à proposta. Pacheco agradeceu o apoio de todos os estados.
— Hoje, unimos todos os esforços nesse sentido de buscar a solução federativa para o maior problema federativo brasileiro, que é a dívida dos estados com a União. […] Esta é uma obra coletiva do Congresso Nacional em favor do Brasil — disse.
O que é o Propag?
De acordo com o texto aprovado pelos senadores, será criado o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) para promover a revisão dos termos das dívidas dos estados e do Distrito Federal com a União.
A proposta autoriza desconto nos juros, dá prazo de 30 anos para pagamento (360 parcelas), abre a possibilidade de os estados transferirem ativos para a União como parte do pagamento e cria exigências de investimento em educação, formação profissional, saneamento, habitação, enfrentamento das mudanças climáticas, transporte e segurança pública como contrapartida.
Entrada
Conforme o projeto, os estados terão até 31 de dezembro de 2025 para solicitar adesão ao Propag. Essa foi uma sugestão da Câmara acatada pelo relator no Senado. O prazo anterior era de 120 dias a partir da publicação da lei.
Como entrada da renegociação, os estados poderão quitar de imediato parte das atuais dívidas transferindo para o poder da União bens móveis ou imóveis, participações societárias em empresas, créditos com o setor privado, créditos inscritos na Dívida Ativa da Fazenda Estadual, dentre outros ativos.
Parcelas
As parcelas mensais serão calculadas de acordo com a Tabela Price e corrigidas mensalmente. O estado poderá fazer amortizações extraordinárias da dívida. Haverá redução dos valores das parcelas ao longo dos primeiros cinco anos.
Durante a vigência do contrato, será proibida a contratação de novas operações de crédito pelo estado para o pagamento das parcelas da dívida refinanciada, sob pena de desligamento do Propag.
Taxa de juros
Será mantida como regra a taxa de juros atualmente cobrada pela União, correspondente ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acrescido de 4% ao ano. Mas haverá descontos de acordo com o montante da dívida que será quitado na entrada e outras regras fiscais e financeiras específicas. Com isso, estados poderão alcançar taxas de juros de IPCA mais 0%, 1% ou 2%. Davi Alcolumbre apontou inconsistências nas opções aprovadas pela Câmara e resgatou o texto do Senado.
“As combinações propostas pelo Senado asseguram que a soma dos juros reais devidos à União com o aporte ao Fundo de Equalização Federativa, os investimentos próprios e os juros implícitos atrelados à redução extraordinária sempre deverá ser igual a 4%”, apontou o relator.
Contrapartidas
Além de ter de pagar as parcelas mensais, o estado terá de fazer anualmente contribuições ao Fundo de Equalização Federativa criado pelo projeto e realizar investimentos, principalmente no ensino técnico profissionalizante.
O texto aprovado também prevê exigências de equilíbrio fiscal aos entes que aderirem ao Propag. O projeto propõe que esses estados limitem o crescimento de suas despesas primárias de forma similar ao arcabouço fiscal (Lei Complementar 200/23).
Fundo
O Fundo de Equalização Federal receberá parte dos recursos economizados com o desconto de juros da renegociação para investimentos em todos os estados e no DF. A medida é uma espécie de compensação para os estados menos endividados.
Outra parte do dinheiro poderá ser integralmente aplicado em investimentos no próprio estado, em vez de ser pago como juros da dívida à União. No mínimo, 60% deverão ser investidos na educação profissional e técnica. Davi Alcolumbre ressaltou que a medida beneficia os estados que estão com as contas arrumadas.
— Nós estamos criando para distribuir para todos os estados brasileiros, a partir de uma decisão na qual socorreremos os estados mais endividados, nós estamos dando condição para outros estados da Federação acessarem recursos frutos do pagamento dessa dívida, da entrega dos ativos desses estados — assinalou.
Atraso ou desligamento
O projeto proíbe os estados que aderirem ao Propag de contratar novas operações de crédito para pagar as parcelas, sob pena de desligamento.
Outra hipótese de desligamento é quando houver atraso de pagamento de seis parcelas em 36 meses. A Câmara havia previsto o desligamento em caso de atraso em três parcelas consecutivas ou seis parcelas não consecutivas durante a vigência do refinanciamento.
“A redação do Senado propõe que o atraso não consecutivo de seis parcelas em 36 meses implicará o desligamento automático do Propag. Por seu turno, a redação da Câmara dos Deputados é mais rígida, promovendo o desligamento se os tais atrasos ocorrerem durante a vigência contratual. Esta redação parece leonina, haja vista que o financiamento poderá durar até 30 anos”, argumentou o relator.
Rio Grande do Sul
Pelo texto, o Rio Grande do Sul, único estado amparado por decreto de calamidade pública votado no Congresso, manterá as obrigações e prerrogativas concedidas pela Lei Complementar 206/24, que suspendeu os pagamentos de sua dívida por três anos, e o incremento gradual de prestações valerá depois desse período.
Má gestão
Durante a discussão do projeto, senadores destacaram a união federativa, mas também ressaltaram que gestores anteriores foram responsáveis pela má situação das contas dos estados.
— A dívida hoje do Rio de Janeiro, do estado de Minas Gerais, de São Paulo e do Rio Grande do Sul, é uma dívida que foi somada, porque não se fez, ao longo dos anos, aquilo que é fundamental na gestão pública: compatibilizar receita e despesa — disse Otto Alencar (PSD-BA).
Na mesma linha, Sergio Moro (União-PR) apontou que, apesar da relevância do programa, governadores foram responsáveis pela situação precária.
— Nós não podemos esquecer que, embora o projeto seja meritório e seja essa solidariedade federativa, que chegamos a essa situação por uma péssima gestão desses estados, no passado, o que levou a essa elevação da dívida.
Randolfe Rodrigues (PT-AP) afirmou que a votação é resultado de uma “solidariedade federativa”.
— A questão da dívida dos estados é algo que tem sido debatido no âmbito deste Congresso Nacional há pelo menos 20 anos. Eu não tenho dúvidas de que este PLP é a solução mais relevante e estruturada para a resolução da dívida. O que nos move neste instante aqui é o princípio da solidariedade federativa — declarou.
Solução
Para os senadores, o projeto traz uma solução efetiva para o problema.
— Esta Casa fez renegociações para a dívida dos estados, infelizmente o resultado ao final não foi favorável, porque os estados usavam a folga de caixa para aumentar as despesas. Desta vez, nós estamos trazendo uma inovação. Os entes federados que forem beneficiados pelo Propag terão a obrigação de conter as despesas, principalmente com pessoal, e atrelá-las em boa parte ao superávit que tiverem no ano anterior — apontou Carlos Viana (Podemos-MG).
Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmou que, sem o PLP, a dívida do Rio de Janeiro seria “impagável”.
— De 1998 até hoje, da dívida que era de R$ 13 bilhões, o Rio já pagou R$ 153 bilhões e ainda deve, hoje, R$ 195 bilhões. Uma dívida, obviamente, impagável. Não havia uma trava para evitar que se aumentassem as despesas de uma forma desenfreada, como faz agora o projeto.
Fonte: Agência Senado