O ministro Luís Roberto Barroso autorizou a retomada do regime legal de desocupação de imóvel urbano em ações de despejo, e também determinou aos Tribunais a criação de comissões de conflitos fundiários, como etapa prévia e necessária às ordens de desocupação coletiva.
A decisão põe fim a um período de 1 ano e 6 meses e que o STF determinou a suspensão dos despejos e as desocupações em áreas urbanas e rurais em razão da pandemia da covid-19. A determinação à época atendeu pedido do partido político Psol, em uma ADPF – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) – 828.
Na verdade a decisão do ministro Barroso foi no sentido de não atender pedido da parte autora, o partido político Psol, que pretendia estender a suspensão de despejos e desocupações de imóveis.
RETOMADA DE DESOCUPAÇÕES – “Autorizo, por fim, a imediata retomada do regime legal
para desocupação de imóvel urbano em ações de despejo (Lei nº 8.245/1991, art. 59, § 1º, I, II, V, VII, VIII e IX)”, decidiu Barroso.
CRIAÇÃO DE COMISSÕES DE MEDIAÇÃO – “Determino que os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais
Federais instalem, imediatamente, comissões de conflitos fundiários que possam servir de apoio operacional aos juízes e, principalmente nesse primeiro momento, elaborar a estratégia de retomada da execução de decisões suspensas pela presente ação, de maneira gradual e escalonada;”, decidiu o magistrado.
DESOCUPAÇÕES COLETIVAS – “Determino a realização de inspeções judiciais e de audiências de
mediação pelas comissões de conflitos fundiários, como etapa prévia e necessária às ordens de desocupação coletiva, inclusive em relação àquelas cujos mandados já tenham sido expedidos. As audiências devem contar
com a participação do Ministério Público e da Defensoria Pública nos locais em que esta estiver estruturada, bem como, quando for o caso, dos órgãos responsáveis pela política agrária e urbana da União, Estados,
Distrito Federal e Municípios onde se situe a área do litígio, nos termos do art. 565 do Código de Processo Civil e do art. 2º, § 4º, da Lei nº 14.216/2021”, determinou.
REMOÇÕES COLETIVAS POR ATOS ADMINISTRATIVOS – “Determino que as medidas administrativas que possam resultar em remoções coletivas de pessoas vulneráveis (i) sejam realizadas mediante a ciência prévia e oitiva dos representantes das comunidades afetadas; (ii) sejam antecedidas de prazo mínimo razoável para a desocupação pela população envolvida; (iii) garantam o encaminhamento das pessoas em situação de vulnerabilidade social para abrigos públicos (ou local com condições dignas) ou adotem outra medida eficaz para resguardar o direito à moradia, vedando-se, em qualquer caso, a separação de membros de uma mesma família.
NOTA DO PORTAL DO STF
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta segunda-feira (31) que os tribunais que tratam de casos de reintegração de posse instalem comissões para mediar eventuais despejos antes de qualquer decisão judicial. Conforme o ministro, a medida de transição visa a reduzir os impactos habitacionais e humanitários em casos de desocupação coletiva.
A decisão foi tomada no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828, na qual o ministro suspendeu, inicialmente por seis meses em junho de 2021, ordens de remoção e despejos de áreas coletivas habitadas antes da pandemia. Ele considerou que despejos em meio à crise da Covid-19 poderiam prejudicar famílias vulneráveis. No fim de 2021, o ministro prorrogou a proibição de despejos até 31 de março de 2022. Depois, em uma terceira decisão, deu prazo até 31 de junho e, por fim, estendeu a proibição até 31 de outubro de 2022.
Ao analisar um novo pedido de prorrogação feito por partidos políticos e movimentos sociais, o ministro decidiu atender em parte. Barroso não prorrogou novamente a proibição de despejos, mas determinou um regime de transição a ser adotado após quase um ano e meio de proibição das desocupações. Conforme a decisão:
1. Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais devem instalar, imediatamente, comissões de conflitos fundiários que sirvam de apoio aos juízes. De início, as comissões precisam elaborar estratégia para retomar decisões de reintegração de posse suspensas, de maneira gradual e escalonada;
2. As comissões de conflitos fundiários devem realizar inspeções judiciais e audiências de mediação antes de qualquer decisão para desocupação, mesmo em locais nos quais já haja decisões que determinem despejos. Ministério Público e Defensoria Pública devem participar;
3. Além de decisões judiciais, quaisquer medidas administrativas que resultem em remoções também devem ser avisadas previamente, e as comunidades afetadas devem ser ouvidas, com prazo razoável para a desocupação e com medidas para resguardo do direito à moradia, proibindo em qualquer situação a separação de integrantes de uma mesma família.
Barroso autorizou ainda a retomada do regime legal para ações de despejo em caso de locações individuais sem necessidade de regras de transição. Para ele, essas locações estão reguladas em contrato e não têm a mesma complexidade do que ocupações coletivas.
A decisão individual será levada a referendo no Plenário Virtual.
Arrefecimento da pandemia
Na decisão, o ministro destacou que houve alteração no cenário epidemiológico no Brasil, com redução do número de casos e de mortes e aumento da cobertura vacinal. Barroso apresentou uma série de dados que comprovam o arrefecimento dos efeitos da pandemia e justificou que, por esse motivo, não há razão para prorrogar novamente a suspensão de despejos. Mas ressaltou a necessidade de medidas de transição em prol da garantia dos direitos humanos.
“Ainda que no cenário atual a manutenção integral da medida cautelar não se justifique, volto a registrar que a retomada das reintegrações de posse deve se dar de forma responsável, cautelosa e com respeito aos direitos fundamentais em jogo. Por isso, em atenção a todos os interesses em disputa, é preciso estabelecer um regime de transição para a progressiva retomada das reintegrações de posse”, afirmou o ministro.
Barroso destacou ainda que “é grave o quadro de insegurança habitacional” no Brasil. “Segundo levantamento do Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua, divulgado na mídia em 13 de outubro de 2022, pelo menos 38.605 novas pessoas começaram a morar nas ruas em todo o Brasil desde o início da pandemia da Covid-19”, alertou o ministro.
O ministro lembrou que fez um apelo ao legislador para medidas que minimizassem impactos habitacionais e humanitários das desocupações, mas que o projeto de lei proposto não teve andamento na Câmara dos Deputados.
“Ante o quadro, cabe ao Supremo Tribunal Federal, à luz da Constituição, fixar diretrizes para o Poder Público e os demais órgãos do Poder Judiciário com relação à retomada das medidas administrativas e judiciais que se encontram suspensas com fundamento na presente ação. A execução simultânea de milhares de ordens de desocupação, que envolvem milhares de famílias vulneráveis, geraria o risco de convulsão social.”
Para o ministro, o Tribunal de Justiça do Paraná desenvolveu um modelo bem sucedido de comissão, que pode ser exemplo para outros tribunais. Ele destacou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) poderá atuar como órgão de consultoria e capacitação para essas comissões.
Leia a íntegra da decisão.