O Tribunal de Contas da União rejeitou os Embargos de Declaração, e manteve a decisão que julgou irregulares as contas do ex-prefeito de João Pessoa, Ricardo Coutinho, referentes ao convênio com o Ministério da Assistência Social e Combate a Fome anunciado para inserção social de agricultores familiares.
O TCU condenou o ex-gestor da Capital ao pagamento de R$ 390 mil , sendo R$ 345.440,51 a título de ressarcimento e R$ 45 mil referente a multa aplicada.
“Trago à apreciação os Embargos de Declaração interpostos (peças 88) pelo Sr. Ricardo Vieira Coutinho contra o Acórdão 12.379/2021-TCU-2ª Câmara que, no mérito, rejeitou aas suas alegações de defesa, julgou suas contas irregulares, condenando-o em débito, além de aplicar-lhe a multa no valor de R$ 45.000,00”, informou o relator.
“Embora o responsável tenha alegado a boa-fé nos autos, em virtude das dificuldades enfrentadas na execução de parcela do objeto, por ocasião das resistências dos beneficiários em aderir ao programa, ele não apresentou elementos que pudessem ser levados em conta, em relação às ações empreendidas por ele quanto às parcelas não executadas, glosadas ou reprovadas. Desse modo, sua boa-fé não pode ser comprovada. O que se observa é que o recurso apresentado demonstra unicamente a irresignação do embargante em relação ao resultado do seu julgamento e busca rediscutir o mérito da matéria, incabível na presente fase processual. Diante disso, inexistindo qualquer obscuridade, omissão ou contradição a ser sanada nos autos, VOTO para que o Tribunal adote o Acórdão que ora submeto a este Colegiado”, concluiu o relator ministro Aroldo Cedraz.
ARGUMENTO DE RICARDO COUTINHO – SERVIÇOS PRESTADOS – “A defesa alega que os serviços foram prestados, e por essa razão, não existiriam danos ao erário. Para confirmar sua tese relembra a narrativa contida no Relatório de Visita (peça 2, p. 236) . Corrobora sua tese com a alegação de que as irregularidades levantadas pelo TCU, na verdade, foram tratadas pela fiscalização do órgão concedente como meras impropriedades.
Análise do relator – No primeiro instante, deve ser observado que nem todos os serviços foram prestados, ou prestados de maneira adequada. Na prestação de contas, constatou-se, parcelas que foram reprovadas, glosadas ou não executadas.
ARGUMENTO DE RICARDO COUTINHO – Culpa dos próprios beneficiários pelo não atingimento das metas
“A defesa complementa seus argumentos, inferindo que houve efetividade dos serviços prestados, e que a parcela de serviços não aceita pelo órgão concedente ocorreu, em função de resistência dos próprios beneficiários em aderir aos projetos, conforme se depreende da narrativa contida no relatório da primeira visita in loco da fiscalização do órgão concedente.
Análise do relator – De outra feita, conforme discriminação do débito apresentada nos parágrafos anteriores, mesmo que a culpa pelo não alcance das metas, ao abranger todos os beneficiários, tenha sido ocasionada por eles próprios, caberia ao convenente, a devolução dos recursos, referentes a essas parcelas que foram reprovadas, glosadas ou não executadas.
ARGUMENTO DE RICARDO COUTINHO – Boa-fé
“O responsável alega boa-fé nos autos, em virtude da concretização da parcela executada, mesmo enfrentando resistência injustificada dos beneficiários.
Análise do relator – É cediço que essa Egrégia Corte de Contas leva em consideração a boa-fé dos gestores, na aferição da punibilidade dos atos irregulares.
ENTENDA O CASO – Em 2005 Ricardo Vieira Coutinho assumiu a Prefeitura de João Pessoa e em 2007 foi firmado um convênio do município de João Pessoa com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome , à época, ( 14 anos atrás) no montante de R$ 342.468,50, sendo R$ 266.868,50 à conta do Ministério e R$ 75.600,00 referentes à contrapartida municipal.
O convênio anunciava a promoção e a inserção social de agricultores familiares e periurbanos do Município de João Pessoa , mediante sistemática de programação de cursos de capacitação, apoio material e equipamentos necessários à produção, beneficiamento e comercialização de produtos agroalimentares, propondo a geração de renda das famílias que se encontram em situação de vulnerabilidade-social.
O convênio teve vigência de 12/2007 a 30/4/2009, sendo prorrogado para 30/11/2009, conforme Termo de aditivo com mais 60 dias para a apresentação da prestação de contas. Os recursos foram liberados por meio de ordem bancária com saque em 27/12/2007.
PRESTAÇÃO DE CONTAS – Tendo em vista que as informações prestadas na documentação da prestação de contas evidenciaram o não alcance dos objetivos esperados nas suas metas/etapas, em virtude de constatação feita por meio das averiguações realizadas na visita in loco por meio de relatórios, o Ministério do Desenvolvimento instaurou Tomada de Contas Especial – TCE- .
RELATÓRIO DA CGU – O Relatório de auditoria 2341/2015 da Controladoria Geral da União também chegou às mesmas conclusões. Após serem emitidos o Certificado de Auditoria, o Parecer do Dirigente e o Pronunciamento Ministerial o processo foi remetido ao Tribunal de Contas da União para apreciação pelos senhores ministros.
RICARDO COUTINHO ATRIBUIU RESPONSABILIDADE AO SEU EX-SECRETÁRIO E ATÉ AOS PRÓPRIOS BENEFICIÁRIOS – Citado sobre as irregularidades na execução do convênio o ex-prefeito Ricardo Vieira Coutinho, através de seu advogado, apresentou defesa que se baseou em três pontos principais :
a) – que não era ordenador de despesa, e que a responsabilidade era do então secretário municipal de desenvolvimento social
b) – que deixou a Prefeitura de João Pessoa em 31/03/2010 e que não deveria ser responsabilizado por fatos ocorridos após essa data
c) – que os serviços teriam sido prestados, e que portanto não teria que se falar em dano ao erário
d) – que a parcela de serviços não aceita pelo órgão concedente ocorreu, em função de resistência dos próprios beneficiários em aderir aos projetos, ou seja, por culta dos próprios beneficiários
ANÁLISE DA AUDITORIA DO TCU :
A auditoria do Tribunal de Contas da União analisou todas as teses apontadas na defesa de Ricardo Coutinho e se manifestou sobre cada uma delas, não acatando nenhuma delas.
Quanto ao argumento de que não era ordenador de despesa e que a responsabilidade seria do então secretário de desenvolvimento social da Prefeitura de João Pessoa
“A defesa alega que a responsabilidade processual nesta TCE seria do secretário municipal, por ser ele o ordenador de despesa. Todavia, não apresentou nenhuma documentação que referendasse a possível delegação de competência. Deve ser enfatizado que o Acórdão 5793/2011- 2ª Câmara, mencionado pelo defendente trata de delegação de competência, fato que não foi comprovado pela defesa. Também, o referido Acórdão trata de audiência, em caso de falha formal, sem dano ao erário, caso diverso do aqui tratado, citação por débito, em função de serviços não prestados. Desse modo, não há elementos nos autos que fundamente o acatamento dos argumentos apresentados pela defesa, permanecendo a responsabilidade nos autos do Sr. Ricardo Vieira Coutinho”, diz a auditoria.
Quanto ao fato de ter deixado a Prefeitura de João Pessoa em 31/03/2010 e que não deveria ser responsabilizado por fatos ocorridos após essa data
“A defesa tenta desconstituir sua responsabilidade, em virtude de manifestações apresentadas pelo prefeito sucessor, após sua saída do cargo ocorrida em 31/3/2010. Entretanto, o
que se busca nestes autos é a recomposição de valores gastos até a data de 23/3/2010. Portanto, os valores cobrados foram utilizados ainda na gestão do Sr. Ricardo Vieira Coutinho.
Desse modo, em virtude da temporariedade dos recursos cobrados e a gestão do Sr. Ricardo Vieira Coutinho, não há como acatar os argumentos da defesa”, afirma a auditoria do TCU.
Quanto as alegações de que os serviços teriam sido prestados, e que portanto não teria que se falar em dano ao erário, e que triam sido meras impropriedades
“No primeiro instante, deve ser observado que nem todos os serviços foram prestados, ou prestados de maneira adequada. Na prestação de contas, constatou-se, parcelas que foram reprovadas, glosadas ou não executadas.
Ademais, essas irregularidades não se trata de meras impropriedades. Verifica-se que, de acordo com o relatório do tomador de contas, o dano ao erário apurado nesta TCE configurou-se pelo fato do objeto não ter sido alcançado o número de beneficiários proposto pelo convenente.
As irregularidades indicadas nos pareceres do FNAS que levaram à impugnação parcial das despesas estariam delineadas na Informação 36/2015-COPC/CGEOF/SESAN/MDS (peça 13) emitida pela Coordenação de Prestação de Contas da SESAN, em 17/6/2015, e no Parecer do Ordenador de Despesas 17/2015 (peça 14), de 7/6/2015, referente ao convênio em questão, tendo em vista que as informações prestadas na documentação da prestação de contas evidenciaram o não alcance dos objetivos esperados nas suas metas/etapas. Tais constatações foram evidenciadas nas averiguações realizadas na visita in loco, por meio dos Relatórios (peça 2, p. 212-228 e p. 236-272), nas datas de 2/6/2011 e 9/3/2012, nos termos do processo 71000.008449/20
Quanto a alegação de que a parcela de serviços não aceita pelo órgão concedente ocorreu, em função de resistência dos próprios beneficiários em aderir aos projetos, ou seja, por culta dos próprios beneficiários
“De outra feita, conforme discriminação do débito apresentada nos parágrafos anteriores, mesmo que a culpa pelo não alcance das metas, ao abranger todos os beneficiários, tenha sido ocasionada por eles próprios, caberia ao convenente, a devolução dos recursos, referentes a essas parcelas que foram reprovadas, glosadas ou não executadas.
Ao não atingir o total das metas avençadas, caberia ao gestor apresentar a sua justificativa pelo não atingimento, juntamente com a correspondente compatibilização financeira pelo resultado alcançado.
O não atingimento da meta pode ser revisto, a qualquer momento, desde que justificado e desde que tenha sido refeita a sua equivalência quanto aos recursos dispendidos. Todavia, se o dano ao erário tiver sido causado por terceiros, esse nexo de causalidade deve ser demonstrado, e não apenas apontado, sob pena de assentimento total pelo gestor da responsabilidade pelo dano. Uma vez que cabe ao gestor a responsabilidade pela aplicação dos recursos avençados.
Desse modo, seus argumentos não devem ser acatados, em função da responsabilidade do gestor pelo cumprimento das metas e a correspondente aplicação dos recursos envolvidos.
As alegações de defesa apresentadas pelo Sr. Ricardo Vieira Coutinho, assim, não elidem as irregularidades apontadas, tampouco tem o condão de alterar o valor do débito.
VOTO DO RELATOR – O ministro Aroldo Cedraz entendeu que as alegações de Ricardo Vieira Coutinho não conseguiram elidir as irregularidades votando pela irregularidade das contas referentes ao convênio, imputando ao ex-gestor da Prefeitura de João Pessoa o total de R$ 390 mil, sendo R$ 345 de ressarcimento com atualização e juros , e R$ 45 mil de multa.
“Não é possível afastar a responsabilidade do ex-alcaide porque não foi apresentado nenhum documento que pudesse referendar o argumento de que o responsável havia delegado a função de ordenador de despesa ao secretário municipal de desenvolvimento social. Ademais, o débito imposto ao Sr. Ricardo se relaciona com as despesas realizadas até o 23/3/2010, ou seja, durante a sua gestão.
Quanto ao mérito, verifico que o dano ao erário apurado nesta TCE configura-se pelo não alcance do número de beneficiários proposto na execução do convênio. É possível constatar que as informações encaminhadas na prestação são suficientes para atestar apenas R$ 148.430,13 do montante total repassado ao município, restando pendente de comprovação o correspondente a R$ 194.038,37, dentre os quais R$ 150.068,37 referem-se aos recursos federais que deverão ser ressarcidos pelo gestor. alcançado.
Acrescento que após a sustentação oral do representante do Sr. Ricardo Vieira Coutinho, ocorrida na sessão da 2ª Câmara deste Tribunal de 20/7/2021, decidi retirar os presentes autos daquela pauta para avaliar com mais profundidade os argumentos expostos pelo Douto Causídico.
Mister recordar que a fase instrucional, nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 160 do RITCU, encerrou-se com o pronunciamento da unidade técnica instrutora, razão pela qual os documentos acostados às peças 48-72 serão recebidos como memorial (art. 160, §3º do RITCU)”, concluiu o relator.